Thursday, October 18, 2007

As vezes eu gosto do bancar o grande poeta gay do passado e brincar de sentir novas sensações, a bochecha nua no metal frio de noite, fumar um cigarro e sair cambaleando pela casa toda escura. Gosto de dar uma de Amelie Poulain, que seria uma sugestão pior do que a do poeta gay do passado, gosto de bancar a Amelie em várias coisas, no cabelo – que seria moderninho para uma menininha, mas cafonérrimo para um cara grande e peludo como eu – e nas sensações das coisas banais, banal falar isso, mas ainda assim uma coisinha gostosa.
Deixar o sorvete derreter na mão sem medo, ou comer pipoca esperando acabar e tirar toda a casquinha do milho no dente. Gosto de esperar a minha dentista jogar aquela água sem graça na minha boa depois de minutos sofridos secos e doloridos, se arrancar a cutícula com a unha e depois esperar sangrar. Gosto do minuto antes da dor póstuma à topada, do primeiro gole da coca em lata. Eu ainda me sinto muito gay falando em sensações... sensações, só aquela batata-frita sequinha do Bompreço.
De abrir a porta antes da pessoa chegar, quando você no fundo já sabe que ela está chegando, de me enrolar no lençol bem quentinho mesmo no calor atordoante daqui dessa porra de cidade quente. Coloco o braço na frente da TV depois de ligar. Mastigar o braço do comandos em ação falsificado e borrachudo, ficar coçando o olho até viciar e parecer que saí de uma ventania na praia. Gosto de arrancar a capa do controle remoto e ficar apertando as teclas por cima daquela borrachinha, cada botão faz pluf e plof e meu dedo fica achando tudo aquilo uma maravilha. Gay!
Minha vó faz o melhor feijão da região. O mais gostoso, o mais caseiro e da vovó o possível. Faz aqueles caldeirões cheios de caldo e com gosto de Knorr, ela abre a panela de pressão e sai aquela fumaça quente, tão quente, que dá vontade de colocar o braço lá dentro só botar pra fuder com a Amelie Poulain que existe dentro de mim.